Eficácia contra ansiedade, depressão e transtornos alimentares
Ansiedade
Ansiedade se define como a expectativa aflita relativamente a um estado-de-coisas imaginário. Frequentemente, em psicanálise, vem à tona que uma certa cena imaginada encobria um desejo que não podia ser reconhecido como tal. A preocupação com o filho dava expressão ao desgosto frente ao desastre que é o casamento. A meticulosidade sofrida no trato do dinheiro dá voz ao desejo de deixar o emprego atual e trabalhar com algo que interesse verdadeiramente. A ansiedade é normalmente o último vínculo da subjetividade com o desejo. Por isso o pânico costuma aparecer quando arrefece a ansiedade e prevalece a calma. São situações em que nos entregamos por completo ao que se espera de nós e em que abrimos mão daquilo que nos é mais íntimo. Daí que a ansiedade seja um grande motor do tratamento psicanalítico: por detrás dela, esconde-se o desejo. E também daí que o princípio regulador do tratamento seja o de transformar ansiedade em desejo.
Depressão
Já se disse que a depressão é o nível zero do desejo.
É uma maneira de expressar o abatimento, a falta de prazer, e a auto-recriminação paralisante que caracterizam a depressão.
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Mas não é suficiente descrever. É preciso dar algo da estrutura.
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Vivemos em um mundo em que o reconhecimento da parte do outro não é genuíno.
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Ele está sempre condicionado. Condicionado a metas, condicionado a amor, condicionado a performance.
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Isso não é o reconhecimento genuíno, o que é fruto de uma subjetivação e interiorização da experiência (humana), e da percepção de que o outro também passa por ela.
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Reconhecimento por meta e performance é o contrário disso. É ser feito de objeto e satisfazer o que fantasiamos ser o desejo do outro.
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Somos educados para satisfazer o que achamos ser o desejo do outro. A partir daí, duas coisas são inevitáveis.
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A primeira é o fracasso. O desejo do outro é marcado por um buraco de saber. Qualquer clareza sobre ele é imaginária.
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Quanto mais achamos que sabemos sobre o desejo do outro, mais cresce a tensão em torno de satisfazê-lo em nossa fantasia.
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E maior a queda quando confrontados com nossa ignorância sobre ele.
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Esse confronto normalmente quando perdemos alguém querido.
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É quando percebemos que não sabíamos nada sobre o desejo do outro.
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Se tivermos estado envolvidos demais com a fantasia de satisfazê-lo, será difícil abrir mão dessa crença.
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Vamos absorver o outro. Vamos nos identificar a ele.
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O outro, a voz do outro assumirá o lugar de nós mesmos. E a maneira como satisfazíamos sua fantasia assumirá a forma de auto-recriminação.
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Antes, nosso desejo fora o desejo do outro. Agora, nosso desejo é o gozo do outro em oprimir-no.
A depressão é a recusa em reconhecer o enigma do desejo de quem se foi. Ela decorre de ele estar preservado em nossa existência.
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Transtornos alimentares
Transtornos alimentares não devem ser pensados como excesso ou falta de alimentos.
O que está em questão é muito mais fundamental.
Trata-se de uma problemática do desejo.
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Uma criança pequena não quer comer. A insistência dos pais piora o problema. Por quê? Porque quando a criança não come, ela continua a ser amada pelos pais, e é muito melhor ser amada por nada do que por ter feito alguma coisa.
É desejo por amor incondicional.
Muitas pessoas acreditam que as crianças nãos seriam capazes disso, que seria um "cálculo" grande demais.
Não há cálculo. A criança aspira ao amor incondicional dos pais desde o primeiro instante. Não comer e, depois, a anorexia, é só a radicalização dessa aspiração.
A criança e o adulto anoréxicos receberam frequentemente muito amor, não pouco. Aprenderam que o amor que vale a pena é o que não depende de nada.
Mas os distúrbios do excesso são o avesso da anorexia.
Ali, é aspiração ao amor do outro; aqui, é a transgressão de cuidados opressivos.
Comer em excesso deprime. E a depressão é se por de fora dos circuitos, de reconhecimento e de desejo. A ingestão excessiva é o ato por meio do qual saio desses circuitos, ou rejeito a ideia de me inserir neles nesta ocasião.
Pessoas assim partem da percepção de que o cuidado que recebe ou receberam era frio, protocolar, angustiante.
Um cuidado triste. O amor não se fazia presente em cada ato. Pelo contrário, era sua ausência e a mensagem de que não se é desejado que predominava.
Ser desejado como criança pelos pais é a base para o desejo do próprio sujeito. Se no lugar disso vem um cuidado por obrigação, revolto-me contra isso. No lugar de amor, depressão, culpa e ansiedade.
Relacionamentos
O amor sempre foi a resposta definitiva para nossa incompletude. ​
Na modernidade, ele assume também o papel de preencher o vácuo deixado pelo desaparecimento da comunidade.
Da família até o mundo do trabalho, passando pela consciência cívica, espaços de experiência comum genuína tornam-se cada vez mais raros.
O isolamentoé a palavra-de-ordem da nossa cultura de produtividade.
E o indivíduo não está feliz com isso.
Se o amor foi no passado uma questão daquilo que é mais íntimo, hoje, ele é uma questão de desamparo. Estão cada vez mais comuns as reações de depressão e abatimento a desilusões amorosas. A resposta natural é a do desespero e, quando ele arrefece, o da resignação e do período de por assim reintegração gradual na vida em comum.
A resposta depressiva de hoje é a de quem se vê em uma posição de exclusão completa, de descarte e de dejeto.
Procuramos por relações "que tragam sentido", isto é, buscamos sentido no outro.
A neurose é a preocupação com um outro demasiado assertivo, claro demais no que ele quer de mim: trabalho, casamento, certo papel social: relacionamentos hoje não satisfazem o desejo, cumprem uma cartilha.
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A cartilha de quem acreditamos que precisamos ser para satisfazer o ideal.
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Isso só pode acabar em sofrimento.
Trauma
Muitas vezes a primeira coisa que ouço de um paciente é: não sofri nenhum trauma.
O que eu escuto: tenho um sofrimento que não consigo por em palavras. E ele se repete. Não posso me livrar dele.
É a definição de trauma.
O grande segredo do trauma é este: ele é uma repetição.
Isso significa que o sofrimento atual da pessoa e sua origem são iguais.
Qualquer pessoa pode entender isso.
O que é traumático? Ter visto os pais brigarem. Por que vim para terapia? Por que passei meu casamento brigando e terminei por me separar.
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Digo que estou na terapia por conta da separação. Nem sempre é fácil enxergar a repetição.
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Na verdade, estou na terapia porque o trauma está se repetindo.
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Fala-se em "padrões". É um termo ruim.
É toda a minha subjetividade que está em causa em uma repetição.
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Minha existência foi organizada em torno dela. Em torno dela, para ela, através dela.
É possível sair do ciclo?
Terapia de jovens
Como um terapeuta se comunica com um jovem?
Dez anos de diferença já são um mundo de cultura de distância.
O psicanalista precisa se informar sobre tudo que interessa ao jovem?
É claro que sim.
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É como falarem a mesma língua.
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Não para se comunicarem, mas para o terapeuta poder ouvir o que está sendo dito para além do que está sendo falado.
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Um seriado qualquer tematiza um problema de dentro de casa.
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É uma maneira de elaborar uma situação sobre a qual não sei falar.
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Devo mostrar isso à pessoa.
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Não é diferente da terapia com uma pessoa mais velha.
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O problema prprio da juventude hoje não é esse.
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Isolamento, jogos, Internet. Esses também não são o problema.
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O problema somos nós.
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Dirigimos expectativas cada vez maiores aos jovens.
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Ficamos dependentes deles.
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E eles, de nós.
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Menos filhos, mais expectativas, menos abertura a experiências, a transformação.
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O problema da juventude hoje é não fazerem experiências.
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Até na terapia isso fica claro.
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Uma demanda comum dos pais é a do "relatório".
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Essa prática é antiética e muito difundida.
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O terapeuta nunca deve falar sobre a sessão com os pais. A subjetividade não tem maioridade penal.
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A reação dos pais na maior parte das vezes é tirar o jovem do tratamento.
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Excesso de preocupação, supressão da experiência. Assim na vida, assim na terapia.
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​Deixemos nossos jovens